Em 1ª instância, Justiça eleitoral condena Tota Barreto a quatro anos de reclusão; Decisão ainda cabe recurso

Foi publicada nesta terça-feira (26) a decisão do Juiz Eleitoral da 20ª Zona Eleitoral Marcelo Marques Cabral condenou o vereador Carpinense Tota Barreto (PSB) a quatro anos de reclusão e dez dias-multa no valor de três salários mínimos vigentes e foi absolvido em parte da acusação apresentada no processo 000675-61.2016.6.17.0020.
A condenação é em um processo de ação penal proposto pelo ministério público eleitoral contra Antonio André Pessoa Guerra Barreto e Antonio Carlos Guerra Barreto. O primeiro réu em audiência, teve aceita a proposta de suspensão condicional do processo por parte do MP em um período de dois anos.
A acusação do ministério publico eleitoral é que “durante o ano de 2016 a Delegacia de Polícia Civil passou a investigar empréstimo consignado, supostamente fraudulento, tomado junto à CEF em prejuízo da vítima Rosangela Lopes de Souza, ocasião em que se verificou que se tratava apenas de uma pequena parte de um esquema criminoso montado pelo primeiro denunciado, vereador da Comarca do Carpina, para obter vantagens ilícitas no exercício do cargo público”.
Tota Barreto foi condenado na fundamentação do artigo 299 do código eleitoral (Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita), que foram apontadas em interceptações telefônicas e foi absolvido da acusação de infrigir o artigo 1º, III, da lei 6.091/1974.
A decisão ainda cabe recurso pelo acusado e o cumprimento da pena só se dará após o transito em julgado que poderá ser também substituída no processo.
Leia abaixo a decisão completa:
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE PERNAMBUCO
CARTÓRIO DA 20ª ZONA ELEITORAL
CARPINA/PE
PROCESSO Nº. 000675-61.2016.6.17.0020
AÇÃO PENAL ELEITORAL
SENTENÇA
Vistos, etc.
O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, por meio de seu representante legal, ofereceu denúncia contra ANTÔNIO CARLOS GUERRA BARRETO (Tota Barreto) e ANTÔNIO ANDRÉ PESSOA GUERRA BARRETO, aduzindo que durante o ano de 2016 a Delegacia de Polícia Civil passou a investigar empréstimo consignado, supostamente fraudulento, tomado junto à CEF em prejuízo da vítima Rosangela Lopes de Souza, ocasião em que se verificou que se tratava apenas de uma pequena parte de um esquema criminoso montado pelo primeiro denunciado, vereador da Comarca do Carpina, para obter vantagens ilícitas no exercício do cargo público.
Aduz o RMPE que na medida em que as interceptações telefônicas eram realizadas surgiram novas provas colhidas de maneira fortuita, solidificando os indícios da fraude. Assim, o primeiro denunciado ofereceu dinheiro para pagamento de ultrassonografia para eleitora que ele considerava uma líder no intuito de angariar votos. Também, segundo a denúncia, o referido denunciado disponibiliza o preço de três ônibus para transporte de estudantes para o Recife. Posteriormente também se descobriu que o mesmo oferece a outra pessoa para comprar remédio como contrapartida de 04 votos. Também se constatou que determinada pessoa realiza o transporte de eleitores, inclusive descobriu-se que o acusado mantinha ônibus em nome de laranjas.
Segundo o Órgão Ministerial, o segundo denunciado, Antônio André, chegou a comprar votos de um eleitor pagando a metade do conserto de sua motocicleta. O mesmo réu também realizou transporte ilegal de eleitores.
Em razão disso, o Ministério Público Eleitoral ofereceu a presente denúncia instaurando a presente ação penal incursionando o primeiro réu nas sanções do art. 299 do Código Eleitoral e art. 1º, III, da Lei 6.091/1974, enquanto que o segundo do art. 299 do Código Eleitoral.
Juntou documentos relacionados ao inquérito policial nº. 03.011.045.0100/2016.1.3.
Por meio da decisão interlocutória de fls. 63/66, este Juízo Eleitoral recebeu a denúncia ao mesmo tempo em que suspendeu o primeiro acusado da função pública de vereador.
Determinada a citação, foi oferecida a defesa preliminar do segundo réu que arguiu, como matéria preliminar, a inépcia da denúncia por falha na exposição do fato criminoso com todas as suas minúcias, prejudicando, assim, o exercício da ampla defesa, além da falta da prova da materialidade delitiva e da ilicitude das provas colhidas a título de interceptação das comunicações telefônicas, malferindo o art. 8º da Lei de Interceptações, além de também se ter ferido o art. 2º, III da mesma lei.
No mérito, aduziu que as conversas telefônicas foram feitas com familiares do acusado, inexistindo qualquer prova do acusado ter incidido no tipo penal que foi denunciado, estando o mesmo transportando seus próprios familiares, estando ausente o dolo especifico que exige o tipo penal. Portanto, situações de mera suspeitas não são suficientes para confirmar uma condenação, sobretudo, por que o tipo penal exige que os eleitores supostamente agraciados estejam identificados ou possam ser identificados. Em suma, não tendo o Ministério Público se desincumbido do ônus da prova da acusação, alega que deve ser absolvido.
Juntou documentos aos autos.
De sua vez, o primeiro réu ofereceu resposta nas fls. 92/205 alegando em matéria preliminar a ilicitude da prova colhida por meio da interceptação telefônica por ausência de ordem judicial autorizadora, não se podendo utilizar da prova colhida em uma investigação em outro procedimento, não se admitindo prova emprestada nestes termos. No mérito, aduz ausência de identificação dos supostos beneficiários da corrupção eleitoral, a inexistência de crime e de nexo causal. Aduz, na conformidade da contestação apresentada pelo outro denunciado, que não existe nenhuma prova de efetiva doação de dinheiro e, muito menos, de troca de votos, não se podendo cogitar, sequer, da existência destes supostos eleitores, estando a denúncia baseada em meras conjecturas, assim como inexistem provas de que cabos eleitorais tivessem transportado eleitores no dia das eleições. Requereu a improcedência da acusação.
Também juntou documentos aos autos.
O RMPE manifestou-se sobre as preliminares arguidas em sede de defesa por meio da manifestação de fls. 164/168, por meio da qual pugnou pela rejeição das mesmas e pela confirmação do recebimento da denúncia.
A decisão interlocutória de fls. 180/182 rejeitou as preliminares arguidas pela defesa dos acusados e revogou a medida liminar de afastamento do cargo eletivo concedida anteriormente por este juízo.
Em audiência, houve proposta de suspensão condicional do processo por parte do MP em relação ao acusado Antônio André Pessoa Guerra Barreto, estando ainda em curso o prazo de dois anos deferido para a suspensão processual.
Termo de audiência de instrução e julgamento em mídia (fl. 241).
O Mistério Público Eleitoral apresentou alegações finais nas fls. 247 e 248, requerendo a procedência parcial do pedido no sentido de condenar o réu apenas nas sanções do art. 299 do Código Eleitoral.
O Primeiro réu, Antônio Carlos Guerra Barreto, apresentou alegações finais nas fls. 253/255, refutando a acusação e confirmando os fundamentos expostos em sua defesa preliminar, razão pela qual requereu a improcedência total da acusação.
É o breve relatório.
Decido.
Cuida-se de Ação Penal Pública Incondicionada promovida pelo Representante do Ministério Público eleitoral ajuizada em face de ANTÔNIO CARLOS GUERRA BARRETO (Tota Barreto) e ANTÔNIO ANDRÉ PESSOA GUERRA BARRETO, por terem supostamente transgredido o preceito incriminador dos tipos penais do artigo 299 do Código Eleitoral e do artigo. 1º, III, da Lei 6.091/1974.
Insta consignar, de proêmio, que o segundo denunciado, Antônio André Pessoa Guerra Barreto, aceitou em audiência a proposta de suspensão do processo formulada pelo RMP, estando, portanto, suspenso em relação ao referido acusado.
A denúncia, todavia, é objeto de análise do Magistrado neste momento com relação ao primeiro denunciado, por ocasião da sentença, porquanto o mesmo não cumpria, na época, as condições para receber o beneplácito legal.
As preliminares foram, com acerto deste juízo, anteriormente rechaçadas.
As questões levantadas na defesa do denunciado se resumem basicamente que os sujeitos corrompidos não foram identificados na forma do que exige o artigo 299 do Código Eleitoral, a não comprovação do nexo causal entre a suposta conduta criminosa e o resultado correspondente e, ainda, a não comprovação de doação de dinheiro por parte do acusado a algum dos seus eleitores, assim como de transporte irregular dos mesmos.
Por fazer parte interligada ao mérito da causa, convém registrar que a prova emprestada de outro feito, ainda que não tenha natureza penal, desde que tenha sido submetida ao crivo do contraditório, pode ser utilizada como meio de prova válido.
Jurisprudência não tem discrepância acerca da possibilidade da utilização de prova emprestada, em casos tais, conforme os seguintes julgados:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E POLÍTICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97). AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. CONFIGURAÇÃO DA CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. VERBO “PROMETER”. DESNECESSIDADE DE RESULTADO NATURALÍSTICO. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PROVA EMPRESTADA. LICITUDE. PEDIDO DE CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO. INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL. DESPROVIMENTO. 1. O agravo regimental reclama, para o seu provimento, que os fundamentos da decisão agravada sejam especificamente infirmados, sob pena de subsistirem suas conclusões. 2. In casu, ainda que fosse ultrapassada a barreira do conhecimento, o recurso especial não mereceria prosperar. Deveras, é irretocável a decisão regional quanto à configuração da prática da captação ilícita de sufrágio com base na promessa de agilização de procedimento médico em troca de voto de eleitor, visto que o ato de prometer está previsto como um dos verbos consubstanciadores da prática do ilícito previsto no art. 41-A da Lei nº 9.504/97. Precedente: REspe nº 4038-03/CE, Redatora para o acórdão Min. Luciana Lóssio, DJe de 25.9.2013. 3. É assente na jurisprudência deste Tribunal e na do Supremo Tribunal Federal a possibilidade de transposição para o processo eleitoral de prova produzida na seara penal, quando licitamente obtida por meio de interceptação telefônica realizada com autorização judicial para instruir investigação criminal. 4. Os recursos eleitorais, em regra, não possuem efeito suspensivo, tal como preconiza o art. 257 do Código Eleitoral. Excepcionalmente, pode o recurso ser recebido no duplo efeito, desde que pleiteado em sede de ação cautelar e evidenciados o fumus boni juris e o periculum in mora. Destarte, o agravo regimental consubstancia meio processual inidôneo para veicular pretensão desse jaez. 5. Agravo regimental desprovido. (TSE – RESPE: 00004533120126240023 LAURO MÜLLER – SC, Relator: Min. Luiz Fux, Data de Julgamento: 01/10/2015, Data de Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Data 14/03/2016, Página 64-65).
ELEIÇÕES 2008. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. ART. 14, § 10, DA CF/88. ASSUNÇÃO DO PÓLO ATIVO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. DEFERIMENTO. PRELIMINARES. PROVA ILÍCITA. NÃO ACOLHIMENTO. LICITUDE DA GRAVAÇÃO AMBIENTAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. VALIDADE DA PROVA EMPRESTADA. DECRETAÇÃO DE INELEGIBILIDADE EM SEDE DE AIME. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE NULIDADE DOS VOTOS. NÃO ACOLHIMENTO. MÉRITO. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97. PROVAS FIRMES DA CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ORGANIZAÇÃO VOLTADA ARREGIMENTAÇÃO DE ELEITORES EM FAVOR DE CANDIDATO A VEREADOR. DEMONSTRAÇÃO DA POTENCIALIDADE PARA INFLUIR NO RESULTADO DO PLEITO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE 1º GRAU. IMPROVIMENTO DO RECURSO. 1.A ação de impugnação de mandato eletivo pode ser ajuizada com base no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, vez que a captação ilícita de sufrágio se enquadra no conceito de corrupção do art. 14, § 10, da CF/88.2.Para a aplicação do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, deve ficar comprovado, de forma inconteste, que houve o oferecimento de bem ou vantagem pessoal em troca de voto, o que restou demonstrado nos autos. 3.Existência de declarações prestadas perante a autoridade policial que juntamente com os documentos apreendidos relativos a cadastro de eleitores e os depoimentos colhidos em juízo demonstram que pessoas foram escolhidas e remuneradas para servir como cabos eleitorais com a função de captar eleitores para votar no candidato a vereador no pleito de outubro de 2008.4.Caracterização de promessa de vantagem suficiente para o enquadramento e aplicação das penalidades do art. 41-A, da Lei das Eleições, bem como de recebimento efetivo de vantagem pelo eleitor e de participação direta, indireta, bem como anuência do candidato. Conclusões embasadas em conjunto probatório amplo que envolve peças do inquérito policial e da instrução judicial. 5.A condenação no processo eleitoral, no criminal ou no civil, com o trânsito em julgado ou com o processo em curso sem a suspensão da inelegibilidade (vida pregressa do requerente a registro de candidatura), configuram suporte fático para reconhecimento da inelegibilidade. Enquadram-se na estrutura da norma no antecedente enquanto a inelegibilidade no consequente. 6.Recurso desprovido. (TRE-AL – RE: 48406 AL, Relator: MANOEL CAVALCANTE DE LIMA NETO, Data de Julgamento: 04/11/2010, Data de Publicação: DEJEAL – Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral de Alagoas, Tomo 236, Data 08/11/2010, Página 02).
EMENTA: RECURSO ELEITORAL – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL – PROVA EMPRESTADA – INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS – CONTRADITÓRIO – OBSERVÂNCIA – TRANSPORTE IRREGULAR DE ELEITORES NO DIA DO PLEITO – ABUSO DE PODER ECONÔMICO – CONFIGURAÇÃO – OBTENÇÃO DE INDEVIDAS VANTAGENS A PARTIR DA CONDUTA ILEGAL – POTENCIALIDADE LESIVA – DEMONSTRAÇÃO – DESNECESSIDADE – CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. A interceptação telefônica, caracterizada por sua natureza cautelar e pela sua imprescindibilidade ao esclarecimento de fatos investigados no âmbito do inquérito policial ou do processo penal, constitui meio de prova indiscutivelmente lícito, uma vez observados os requisitos legais e a reserva de jurisdição a ele inerente. A impossibilidade de conhecimento prévio acerca da realização da interceptação pelo investigado não ofende o princípio do contraditório, assegurado às partes na forma diferida ou postergada. Comprovada a participação do investigado, de sua esposa e de seus filhos em ação destinada a viabilizar o transporte irregular de eleitores no dia do pleito, e consideradas as inegáveis vantagens auferidas pelo então candidato com o oferecimento da benesse, configura-se o abuso de poder econômico, haja vista a possibilidade de induzir nos eleitores a falsa percepção de o candidato já estar por eles trabalhando antes mesmo de ser eleito, além de vincular sua imagem ao poderio econômico, facilitador, em tese, da gestão do Município. Desnecessidade, a partir da vigência da LC n.º 135/2009, da demonstração da potencialidade lesiva do ilícito eleitoral, sendo suficiente a demonstração da gravidade das circunstâncias que o caracterizam. Conhecimento e desprovimento do recurso. (TRE-RN – REL: 159785 RN, Relator: VERLANO DE QUEIROZ MEDEIROS, Data de Julgamento: 28/11/2013, Data de Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Data 03/12/2013, Página 02/03).
Neste sentido, a permissividade constitucional, legal e jurisprudencial, não dão margem a qualquer dúvida da utilização do meio de prova como aconteceu no presente caso.
Aliás, na situação ora analisada, existiu ordem judicial em sede de investigação antecedida de procedimento criminal preliminar próprio instaurado em face do acusado, portanto para fins de investigação de crime doloso punido com pena de reclusão, sendo o único meio hábil na hipótese de a polícia judiciária colher elementos indiciários para rechear o inquérito policial.
Não obstante a fundamentalidade do direito previsto no artigo 5º, inc. XII, da Constituição Federal, como sói acontecer com os demais direitos fundamentais, a limitabilidade é característica inerente ao mesmo e que, na sua situação constitucional típica, a limitação decorre de seu próprio texto. Logo, não há que se falar em ilicitude da prova angariada pela Polícia e pelo parquet.
Como se não bastasse a licitude da prova no sentido constitucional, a sua produção levou em consideração rigorosamente os requisitos previstos na lei 9.296/1996, passando longe de qualquer alegação que possa configurar a sua ilegitimidade (licitude material, formal e legal) e, por conseguinte, a sua vedação (provas vedadas).
O tipo penal consubstanciado no artigo 299 preconiza: ¿Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita” . “Pena – reclusão até quatro anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa” .
O preceito legal criminaliza a conduta da corrupção eleitoral consiste no fato de o candidato a qualquer cargo eletivo oferecer, dar, solicitar ou receber qualquer espécie de vantagem, incluindo dinheiro, no intuito de obter ou dar votos, conseguir ou prometer abstenção, ainda que não haja aceitação por parte do cooptado.
Da simples leitura do tipo penal se identifica tal delito como sendo de natureza formal, isto é, não há necessidade de que o resultado almejado pelo candidato se conclua. Destarte, o resultado material ou final pode não se configurar no caso concreto e, ainda assim, consumado estará o delito de corrupção eleitoral.
Cai por terra a alegação da defesa de que não houve comprovação do recebimento de oferta a eleitor, frustrando em consequência o efetivo resultado nas urnas, e assim a configuração penal.
De mais a mais, para a configuração do crime em tela, também não existe necessidade de que o cooptado eleitor seja identificado, bastando tão somente que haja dolo específico, consiste na vontade deliberada de angariar vantagem no pleito eleitoral destinada a algum eleitor identificável e apto a votar.
A jurisprudência, com relação ao tema, assim se manifesta:
HABEAS CORPUS. CRIME DE CORRUPÇÃO ELEITORAL. ELEIÇÕES DE 2016. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. NEGOCIAÇÃO DE CONSERTO DE MOTOCICLETA EM TROCA DE VOTO. ELEITORES IDENTIFICÁVEIS. ORDEM DENEGADA. 1. Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, além de ser necessária a ocorrência de dolo específico, qual seja, obter ou dar voto, conseguir ou prometer abstenção, é necessário que a conduta seja direcionada a eleitores identificados ou identificáveis, e que o corruptor eleitoral passivo seja pessoa apta a votar. Precedentes. 2. Como a ação penal se encontra no seu início, é possível que o eleitor possuidor/proprietário da motocicleta, narrada na denúncia, venha ser identificado no decorrer do processo, de forma que se mostra prematuro trancar a ação penal por este motivo. 3. Ordem denegada. (TRE-PE – HC: 7214 CARPINA – PE, Relator: ALEXANDRE FREIRE PIMENTEL, Data de Julgamento: 15/05/2017, Data de Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 106, Data 19/05/2017, Página 13).
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. CONDENAÇÃO CRIMINAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL. CÓDIGO ELEITORAL. ART. 299. PROVIMENTO. 1. Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, além de ser necessária a ocorrência de dolo específico, qual seja, obter ou dar voto, conseguir ou prometer abstenção, é necessário que a conduta seja direcionada a eleitores identificados ou identificáveis, e que o corruptor eleitoral passivo seja pessoa apta a votar. Precedentes. 2. Não há falar em corrupção eleitoral mediante o oferecimento de serviços odontológicos à população em geral e sem que a denúncia houvesse individualizado os eleitores supostamente aliciados. 3. Agravos regimentais providos. (TSE – AgR-AI: 749719 RJ, Relator: Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 11/12/2014, Data de Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 35, Data 23/02/2015, Página 54).
Pois bem, o caso sub judice espelha promessas do candidato a eleitores identificáveis a fim de angariar voto de forma ilícita consequenciando na quebra do princípio da isonomia eleitoral que deve existir entre todos os candidatos, configurando, abuso de poder econômico.
A prestação de serviços de caráter assistencialistas como a promoção de cursos para pessoas diversas da comunidade ou o atendimento médico-odontológico também prestados a pessoas indetermináveis pelo candidato, p. ex; não é hábil para configurar o tipo penal ora discutido, porém, no caso, a confissão do denunciado de que gastou do seu bolso expressiva quantia em dinheiro, quantia esta que ele não retira facilmente do exercício do seu mandato, configura indício da pratica delitiva em comento.
Algumas testemunhas ouvidas em juízo confirmaram que o ora acusado, candidato a vereador, gastou mais de R$ 100.000,00 (cem mil reais) para que fosse disponibilizado o serviço de transporte de eleitores, não havendo a identificação dos mesmos, o que redunda na sua absolvição quanto ao crime previsto no artigo 1º, III, da Lei 6.091/1974, ainda mais porque testemunhas ouvidas em sede judicial declararam que o candidato remunerava o serviço em desfavor dos alunos (taxa cobrada a R$ 60,00 – sessenta reais). Todavia, tais fatos são indiciários da prática desonesta empregada pelo acusado no dia do pleito eleitoral, denotando a sua contumácia em ações fraudulentas.
As interceptações telefônicas, de sua vez, revelam com riqueza de detalhes, por outro lado, o crime de corrupção eleitoral cometida pelo denunciado “Tota Barreto” , o qual, agindo com abuso de poder econômico, passou a explorar os seus potenciais eleitores para retirar proveito eleitoral no dia e nos dias que antecederam ao pleito.
Por exemplo, em escuta telefônica conseguiu-se detectar a conversa entre o acusado e “HNI” , por meio da qual se detecta que o primeiro prometera ao segundo arrumar vinte reais para dar a eleitores (gravado em mídia, página 65 de 196).
Em seguida, conversa registrada entre o acusado e Anderson, detecta-se que este segundo declara ter mil reais de notas de vinte, razão pela qual o acusado diz que aceita (gravado em mídia, página 68 de 196).
Em conversa com “Rui” , o denunciado afirma que é para dar a vinte reais a uma pessoa de camisa preta apenas quando ela votar, entretanto, “Rui” afirma que a pessoa se trata de “Yury” (Cicinho) que diz ser motorista trabalhando para o candidato, momento em que o denunciado determina que dê a ele o que ele necessitar. Também, em conversa gravada, o acusado “Tota” é solicitado por “MNI” para pagar trezentos reais a um grupo de eleitores (gravado em mídia, página 72 de 196). Destarte, fica nítido que o acusado pagou combustível para a Kombi em troca de votos de pessoas que vieram de Recife para votar Carpina.
Em conversa com sua filha, “vez que o chama de painho” , e com “HNI” (gravado em mídia, página 76/80 de 196), o acusado trata de sacar dinheiro em Nazaré da Mata, justamente no contexto de compra de votos dos autos.
Veja-se, por exemplo, ainda, que o filho do acusado, Antônio André Pessoa Guerra Barreto, compra voto de eleitor (em favor do seu pai) que estava com motocicleta na oficina da pessoa conhecida por Artur, quando pagou parte do conserto da mesma (gravado em mídia, página 171 de 196).
Em suma, contrastando os depoimentos judiciais e toda a prova colhida a título de prova emprestada, entendo caracterizado o crime previsto no art. 299 do Código Eleitoral, consubstanciadas todas as suas elementares, subsistindo, assim, apenas a condenação do acusado.
Ante o exposto, por tudo o que até aqui analisei, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na presente Ação Penal Pública pelo o ilustre RMPE, no sentido de ABSOLVER o acusado ANTÔNIO CARLOS GUERRA BARRETO da acusação de ter infringido o art. 1º, III, da Lei 6.091/1974 e de CONDENAR o mesmo acusado nas sanções do art. 299 do Código Eleitoral Brasileiro.
Passo para a fase da dosimetria da pena, na forma do art. 68 do Código Penal Brasileiro.
Quanto as circunstâncias judiciais, capituladas no art. 59 do CPB, entendo que a maioria delas é desfavorável ao agente. A culpabilidade, tratando-se de juízo de reprovabilidade que recai sobre a conduta do acusado não o beneficia, porquanto, o juízo de reprovabilidade da conduta recai de forma severa nessas espécies de crime, ou seja, a conduta do réu além de lesar a isonomia do pleito, coloca a frente da gestão da coisa pública pessoas sem legitimidade efetiva para o cargo.
Os antecedentes não lhe prejudicam, considerando que o acusado não foi condenado por sentença passada em julgado ainda em outros processos.
A conduta social do acusado não o beneficia, posto que o mesmo responde a vários processos-crime na Vara Criminal da Comarca do Carpina – PE, inclusive já tendo sido condenado no Juízo de Direito da 2ª Vara Cível também em Carpina em uma ação de Improbidade Administrativa.
A personalidade do agente é voltada à prática de crimes eleitorais e contra a Administração em geral.
Os motivos são reprováveis, entretanto, são os comuns e normais na espécie de delito, isto é, o intuito de sagrar-se facilmente vencedor em pleitos eleitorais com burla ao ordenamento jurídico.
As circunstâncias do crime também não lhe prejudicam.
As consequências do crime são, entretanto, desastrosas para a sociedade, máxime quando se leva em consideração a escolha de representantes do povo para lidarem com o trato da coisa pública.
Por fim, o comportamento da vítima, que é a sociedade como um todo, em nada contribuiu para a eclosão do delito.
Considerando que das noves circunstancias judiciais, apenas três beneficiaram o acusado, a pena base deve se aproximar do máximo legal. Razão disso, fixo-lhe a pena base em 04 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa no valor de três salários mínimos vigentes ao tempo do fato, considerando as circunstâncias judiciais desfavoráveis ao réu e a sua razoável condição financeira e econômica (art. 49, § 1º do CPB).
Inexistem circunstâncias atenuantes e agravantes, assim como circunstâncias judiciais de diminuição ou aumento de pena que possam beneficiar ou agravar a situação do condenado.
Em razão do exposto, torno a pena de 04 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa no valor de três salários mínimos vigentes ao tempo do fato concreta e definitiva.
Aguarde-se o cumprimento das condições impostas com relação à suspensão condicional do processo quanto ao segundo denunciado, para conclusão e novas deliberações.
O regime de cumprimento de pena, com relação ao ora condenado, deve ser estabelecido na forma do art. 33, § 2º, “c” do CPB, podendo, após o trânsito em julgado da sentença, ser substituída por penas restritivas de direito a serem impostas em audiência admonitória, na forma do art. 44, I do mesmo Código, a critério do juízo.
Após o trânsito em julgado da presente decisão:
I – Façam-se as anotações de estilo;
II – Oficie-se aos Órgãos de Estatística e ao ITB;
III – Expeçam-se as Cartas de Guia definitiva;
IV – Oficie-se ao TRE para as finalidades do art. 15, III da CF.
Cumpra-se!
Capina – PE, 18/06/2018.
Marcelo Marques Cabral
Juiz Eleitoral